O perigo da divinização de métodos

Vanderly Rodrigues

Nós estamos procurando melhores métodos. Deus está procurando melhores homens. Deus não unge métodos, Deus unge homens” (Edward McKendree Bounds – Poder através da oração).

ikarus - Personagem da mitologia grega,
 conhecido pela sua tentativa frustrada de, voando, 
abandonar Creta. Tal tentativa culminou na 
 queda e morte do mesmo.
Líderes cristãos têm o péssimo hábito de divinizar suas metodologias de trabalho na igreja. Nos últimos anos, devido ao uso do marketing, isso se tornou notório e nocivo, muitos estão perdidos e escravizados por metodologias humanas que nem sempre dão resultado esperado.

Um dos métodos mais relevantes e atuais para dinamizar a comunhão e missão da igreja é estruturar a igreja em pequenos grupos-células.

Pessoalmente prefiro a palavra Grupos por que a analogia com célula é imprecisa.  A Bíblia referir-se a cada um de nós como membros do Corpo de Cristo. Uma “célula” não pode ser maior que um membro.

J.I. Packer lembra que “o testemunho da história é que tais grupos surgem espontaneamente quando o Espírito desperta a igreja e eles sempre são necessários para que uma comunidade grande mantenha a sua vitalidade espiritual durante qualquer período de tempo” (Na Dinâmica do Espírito). Para que uma igreja permaneça unida, cresça e se multiplique em pequenos grupos, ela deve ser bem organizada e coordenada. Uma forma de fazer isso é preparar lideres para os grupos, com Supervisores sob a liderança capacitadora de um pastor, que presta contas a um grupo de presbíteros que divide com ele e outros pastores o governo da igreja.

É possível encontrar princípios Bíblicos para o uso dessa metodologia. O conselho de Jetro a Moisés (Ex 18) é o precedente bíblico para delegar ministérios. Jesus enviou discípulos-missionários em duplas com a instrução de usarem casas de pessoas digna como base para evangelizar aldeias e cidades (Lc 9:1-10; 10:1-12). Paulo se serviu de casas de famílias receptivas como estratégia para plantar igrejas (At 16:15, 31-34, 40; 17:5; 20:20).

Estes precedentes podem se usados para considerar lícito o método quando feito dentro dos limites bíblicos, mas não torna o método divino, obrigatório ou apropriado para qualquer contexto.

Na verdade as igrejas caseiras dos primeiros séculos eram bem diferentes dos atuais grupos-células. As reuniões aconteciam nos cenáculos (sala de jantar) onde se reuniam um número variado de pessoas (120 pessoas por ocasião da escolha de Matias, conforme Atos 1:15). Os cenáculos eram adaptados para o culto cristão com movéis (batistério e cadeiras para os presbíteros e diáconos) e utensílios (para celebrar a eucaristia), bem semelhantes aos templos cristãos atuais. Atos 20:7-12 descreve uma tipica reunião dominical em um cenáculo para partir o pão, bem diferente de uma reunião de célula.

Foram usados outros locais estratégicos para evangelização, ensino e reuniões cristãs: Paulo usou a escola de Tirano (Atos 19:9), pregou na praça (Atos 17:17) e procurava lugares de oração (Atos 16:13). O lugar para as reuniões cristãs mais freqüentemente mencionado no NT é a Sinagoga (Atos 18:4, 19; 13:5, 14, 42, 44; 14:1; 17:1, 10, 11; 18:24-26). Alguns eruditos concluem que as primeiras comunidades cristãs formam sinagogas particulares, pois, segundo o Mishnah (leia sobre isto aqui), eram necessários somente 10 judeus de sexo masculino para formar uma Sinagoga. Tiago descreve as reuniões cristãs como uma espécie de reunião da sinagoga (Tiago 2:2).

Também o fato da igreja cristã, após o Edito de Milão em 313, construir grandes edifícios públicos para reunir maior número de pessoas, não foi nenhuma apostasia, mas o desenvolvimento natural e desejável da igreja.

O movimento de células não é uma Nova Reforma na igreja, pois Reformar é voltar a forma antiga e a igreja primitiva não era uma igreja em células, pode ser uma contextualização prática, dedes de que não viole os ensinos biblicos de governo da igreja e liberdade cristã. Dependendo das condições, o movimento de células se torna uma apostasia ao sacralizar metodologias humanas de gestão empresarial.

Perigos de sacralizar o método:

1º. Condicionar o agir do Espírito por métodos. E. M. Bounds escrevendo sobre a maior necessidade da igreja, disse: "O que hoje a Igreja necessita não é de mais e melhor maquinismo, de novas organizações ou mais e novos métodos, mais homens a quem o Espírito Santo possa usar – homens de oração, homens poderosos na oração. O Espírito Santo não se derrama através dos métodos, mas por meio dos homens. Não vem sobre maquinarias, mas sobre homens. Não unge planos, mas homens – homens de oração".

2º. Valorizar métodos criados por homens em detrimento dos meios de graça instituídos por Cristo para edificação da igreja. A Palavra, os sacramentos e a oração são os meios de graça eficazes e permanentes que Cristo instituiu na igreja, eles não podem ser sufocados por nenhuma metodologia eclesial. “O Espírito de Deus torna a leitura e especialmente a pregação da Palavra, meios eficazes para convencer e converter os pecadores, para os edificar em santidade e conforto, por meio da fé para a salvação” (Breve Catecismo 89).

3º. Sufocar a liberdade cristã em uma estrutura eclesiástica. Quando a metodologia celular é divinizada com a citação de textos bíblicos (fora do contexto), ela se torna uma ferramenta de controle. Toda vida da igreja é reinterpretada: o método substitui o evangelho, a Igreja se torna uma organização piramidal, o pastoreio vira exercício de controle, a missão uma propaganda e a submissão uma ação de escravos.

Que Deus conceda sabedoria aos pastores para que possam conduzir a igreja de Cristo com inteligência e fidelidade.

________________
Leia mais sobre esse assunto:
7 Razões Porque Precisamos de Pequenos Grupos (ou Assista o vídeo): Uma apologia de John Piper ao uso de pequenos grupos.

Comentários

  1. Parabéns Irmao, maravilhoso o texto! Sou da Ad Madureira em Sp, o irmao já ouviu sobre a Ad do Amazonas, pr Jonatas Camara, adotou a visao celular, que que vc achq?

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