Cícero e o STF

Renan Almeida

Cícero foi uma das mentes mais brilhantes da Roma antiga. Apresentou aos romanos as escolas de filosofia grega, chegando a produzir um vocabulário filosófico em latim para que o povo romano pudesse se utilizar destes termos. Foi um linguista, tradutor e filósofo e, não se pode esquecer, de que foi este um grande advogado. É indicustível ter sido ele um grande pensador dentro do contexto das ciências humanas. Pensou a sociedade e a política como poucos homens fizeram durante toda a história de Roma ou do mundo. Cria ele que sua carreira política era uma grande façanha, mas ele é muito apreciado pelo seu humanismo, trabalhos filosóficos e políticos. Foi ele um grande incentivador do retorno à república tradicional. Ele é o autor de uma das frases mais famosas da história, a saber, “Oh tempos! Oh costumes”, tendo escrito esta frase, em bom latim [o tempora o mores], em seu 4º livro “Segunda oração contra Verres” (capítulo 25) e “primeira oração contra Catilina”.

Oh tempos, Oh costumes! Este é um daqueles pensamentos que de tão profundos não necessitam de verbos, sejam eles de ligação ou indicadores de ação. Também isentam-se de uma explicação, haja visto que é uma expressão abstrata que se aplica, de foma justa, a um conjunto infindável de situações. Ante isto, utilizo-me desta sábia expressão de Cícero, o filósofo, para analisar a decisão do STF no que concerne ao aborto de anencéfalos. Renan, mas já se passou mais de 1 semana desde que o STF decidiu pelo aborto de anencéfalos. Por que falar sobre isto agora? -  Poderá você questionar. Bem, penso que enquanto cristão não posso me isentar de emitir uma opinião sobre o assunto e ademais, como alguém que está envolvido na área jurídica, penso que se faz necessário exclarecer a linha de pensamento seguido pelo STF ao optar pela liberação desta modalidade de aborto; outro motivo pelo qual exponho minha opinião apenas agora, é pelo fato de que escrever não é o ato de “encher linguiça”, como se diz na Bahia, mas é o ato de analisar cuidadosamente, pesando as informações e buscando explicar a situação de forma mais acessível possível. Digo isto a fim de que os apologistas falem acerca dos assuntos sem pressa, pois uma defesa não apressada, pode ser a defesa que melhor foi elaborada. Não busco com isso afirmar que minha defesa é melhor do que a de muitos, mas ouso dizer que minha explicação, mui possivelmente, será exclarecedora em seus aspectos jurídicos e teológicos se comparada àquelas que mais parecem “manchetes sensacionalistas de jornais de grande circulação”.

Da divisão dos poderes

Em termos políticos, a Tripartição dos poderes, não é, de fato, 3 poderes. Como assim? Dalari entende que o Estado é soberano, logo se o Estado é soberano não há como se dividir os poderes, pois haveria consequentemente redução de poderes do Estado, então não haveria como falar em soberania da nação. Seguindo esta ótica, o que há é um Estado com poderes soberanos e ilimitados, mas que resolveu “delegar” (não dividir) seus poderes a “órgãos” específicos, sendo estes o Executivo, Legislativo e Judiciário. A teoria da tripartição dos poderes foi proposta, originalmente, por Montesquiéu em sua obra “O Espírito das Leis” de 1748. Entendia ele que o Poder concentrado nas mãos de um único, genericamente chamado Estado, dificultaria a administração de um país e seria a forma mais adequada para que a corrupção ou o abuso do poder se tornasse marca comum na administração de uma nação.

Em sua análise, definiu que o Estado deveria delegar de seus poderes, inerentes à sua soberania, a responsabilidade de legislar ao “Poder” Legislativo; deveria haver um poder responsável pelo julgamento de indivíduos que se rebelassem contra a legislação da nação, e este seria o “Poder Judicial” ou “Poder Judiciário” e, por fim, haveria um “órgão” responsável por garantir que a lei fosse cumprida, seria este o “Poder Executivo”. Em teoria, tudo muito belo, no entanto com algumas aberturas na teoria.

Aberturas na teoria? Sim! Montesquiéu, em sua teoria de tripartição dos poderes, se esqueceu de definir “o que é exatamente legislar, cumprir e julgar”. Por não fazer isso de forma tão clara, acabou ele por gerar uma teoria que permitia que um dos poderes  pudesse adentrar em uma área que não era sua, por direito. Foi algo semelhante a isto que ocorreu no caso da “Liberação do aborto dos anencéfalos”. O poder Judiciário adentrou na esfera do poder legislativo, criando uma “lei” (na verdade, criou uma espécie de “súmula”). Claro que não adianta os apologistas fazerem #mimimi sem antes entender os motivos pelo qual o STF fez isso. O STF, de fato, adentrou em uma área que não lhe cabia, mas o fez com razão; no entanto, explicarei isto mais adiante.

Em 1767, nasce Benjamin Constant. Foi ele um pensador político e desenvolveu uma nova teoria da “Divisão dos poderes”. Na teoria de Constant, criada visando uma Monarquia Constitucional, define ele o poder real como sendo um poder neutro. Ele não é um poder que se envolva diretamente com as atitudes dos demais poderes, mas impede que abusos sejam cometidos ou que um poder adentre na esfera que é de responsabilidade de um outro poder. De forma simplificada, poderíamos dizer que, se esse modelo fosse o modelo adotado em nosso país, a presidente da República analisaria o caso e impediria o STF de legislar acerca deste assunto sob alegação de que este era competente apenas para julgar e não para legislar. Infelizmente, como bem sabemos, nosso país adota a teoria política de Montesquiéu.

Anomia

O conceito sociológico e jurídico de anomia é um estado de falta de objetivos e perda de identidade, provocada pelas intensas transformações que ocorrem no mundo moderno. É importante salientar, que o padrão legislativo e de julgamento do mundo contemporâneo é baseado nos conceitos humanistas, não sendo mais utilizados os conceitos de Direito Natural e/ou Direito Divino (por alguns chamado de Direito Canônico, no entanto, não creio ser esta definição adequada, pois incluíria “bulas papais” e coisas semelhantes). Infelizmente, o conceito humanista rompe com a ideia de que a sociedade deve ser explicada à luz das Escrituras e/ou da religião (seja ela qual for) e se utiliza da razão para explicar o mundo, rompe-se com os valores tradicionais e, consequentemente, com os morais. Até a moral se torna relativa e, então, pode-se gritar “Oh tempos! Oh costumes!”. É no conceito de Anomia, que é baseada fortemente em um conceito relativsta, uma vez que entende as transformações como totalmente livres de qualquer padrão moral declarado por Deus, que a frase de Cícero se torna como uma verdade que ecoa fortemente nos ouvidos. É neste ponto que o conceito de moral choca e um “Oh” é a representação do desespero em face à forma que o mundo encara suas próprias ações.

Analisando este conceito à luz do caso em concreto, isto é, à luz da decisão do STF, entende-se que houve uma perda de identidade por parte do legislativo, uma omissão “inaceitável” ao não legislar sobre o assunto (seja condenando ou favorecendo) e o STF, após muitos anos que o projeto de legalização desta modalidade de aborto tramitava no senado, se viu obrigado a colocarem o tema em pauta para votação, uma vez que se tratava de matéria constitucional. Matéria constitucional? Sim! Havia um bom número de processos solicitando ao STF deferimento do aborto, quando se tratasse de anencéfalos,  e a alegação era sempre a de que “A Constituição Federal defende a dignidade da pessoa humana”

Então...

Ministro Cezar Peluso





Até aqui, os aspectos jurídicos e sociológicos foram analisados de forma sintetizada, afinal, o referido tema e as relações jurídicas mencionadas são amplas o suficiente para que seja elaborada a minha monografia (e que Deus tenha misericórdia de mim quando este dia chegar). No entanto, antes de finalizar a análise jurídica, cabe informar que o STF é composto de 11 ministros. Destes 11, 1 estava impedido de participar da votação. E destes 10 restantes, apenas o Ministro Cesar Peluso e Ricardo Lewandowski votaram contra a aprovação do aborto de anencéfalos. O Ministro Cesar Peluso afirmou que não se pode impor “pena capital ao feto anencefálico, reduzindo à condição de lixo ou de alguma coisa imprestável, um incapaz de pressentir tal agressão e de esboçar defesa” e o  Ministro Ricardo Lewandowski afirmou que "Uma decisão judicial isentando de sanção o aborto de fetos anencéfalos, ao arrepio da legislação existente, além de discutível do ponto de vista científico, abriria as portas para a interrupção de gestações de inúmeros embriões que sofrem ou viriam sofrer outras doenças genéticas ou adquiridas que de algum modo levariam ao encurtamento de sua vida intra ou extra-uterina. Meu voto, com devido respeito, será em sentido contrário ao dos que me antecederam", anunciou.

Até aqui temos analisado tudo à luz das questões ligadas à Anencelia, mas a visão sobre Anomia e tripartição de poderes é essencial na compreensão de como a Suprema Corte ou instâncias inferiores julgam os casos que lhe são trazidos. A Anomia, como dito anteriormente, é um grave problema, pois é enleivada pelo conceito relativista das transformações sociais. A anomia se orienta pelas transformações, quando na verdade são as transformações que deviam ocorrer dentro de conceitos e determinações éticas e morais devidas. Se a Anomia é um entendimento relativista e, consequentemente, sujeito à falhas, o é porque reconhece que o Estado em si mesmo é incapaz de abordar e regular todas as relações jurídicas e transformações sociais. Há uma inversão indevida do ônus da soberania, no qual a soberania é transferida às transformações e no qual o estado perde sua pose de regulador das relações e passa a ser regulado pelas mesmas.

Acerca da Lei de Deus

Façamos uma pequena viagem no tempo. Peço que nos esforcemos a lembrar-mo-nos de um passado não muito distante, talvez, década de 1990. Como a sociedade enxergava, por exemplo, o Homossexualismo? Mães chorariam e se desesperariam se descobrissem que seus filhos eram gays; definitivamente, a sociedade via tal prática como  o que realmente é, um atentado contra a ordem da criação ou, no popular, uma “pouca vergonha”; casamento homossexual? Algo impensável na concepção de mundo da maioria dos brasileiros. Alguns dirão: Renan, isso era fruto da falta da informação! Isso era fruto de um preconceito descabido.

Ao falar de Lei de Deus, me refiro ao padrão Ético e Moral revelado por Deus em sua palavra, sendo melhor representado pelos 10 mandamentos e ao falar de Governo Civil, faço referência às leis éticas e morais referentes ao modo adequado de governar a nação, excetuando-se destas todas aquelas leis que estão, de alguma forma, vinculadas aos preceitos cerimoniais, haja visto que as cerimônias apontavam para Aquele que viria, não possuindo mais relevância ou aplicabilidade.

Essa alegação seria legítima se eu analisasse o mundo pelos olhos dos eventos e transformações sociais. No entanto, o que tenho visto não é apenas um conjunto de transformações, mas sim um movimento de rejeição à Lei de Deus. Como assim? O caminho mais curto para que a humanidade entre em uma crise de proporções inigualáveis é a rejeição à Lei de Deus de forma total.

Reconheço que os governos do mundo tem feitos grandes esforços na busca de governar justamente e para todos, salvo algumas exceções . No entanto, não podemos, de forma alguma, imaginar haver justiça longe da vontade e das leis estabelecidas pelo próprio Criador. As Leis do Criador são éticas, morais, atemporais e independem do lugar e da sociedade para que sejam aplicadas. Somente este pensamento pode retirar a sociedade de sua concepção relativista, própria de um discurso pós-moderno e pragmático e que nenhum bem tem trazo à sociedade. Se algum fruto tem sido colhido da tentativa de se viver longe da Lei de Deus, o único fruto é a auto-destruição.

Ora, onde encontro que a Lei de Deus, em seus aspectos civis devam ser aplicadas em toda sociedade e em todas as épocas? Ora, tal indagação merece uma outra que é: “Quando foram elas abolidadas?.”. Antes de responder isto, devemos nos questionar o que é uma lei. Lei é um decreto de caráter coercitivo imposta pelo Estado a todos os integrantes daquela sociedae, depreende-se daí que ninguém está isento desta autoridade. Agora precisamos entender qual a ordem pela qual o poder e autoridade para governar flui para então termos uma visão mais específica acerca do caráter da Lei de Deus e sua aplicabilidade. O Apóstolo Paulo ao escrever aos Romanos (Cap. 13) afirma que toda autoridade humana vem de Deus e mais adiante ele afirma que aquele que resiste à autoridade humana, resiste ao próprio Deus, daí, fácil é compreender que o Poder vem em na escala de: Deus >> Governo Civil >> Homens do povo.

Falando em uma linguagem mais jurídica, o verdadeiro Portador do Poder é Deus, mas Ele decide delegar ou entregar uma procuração ao Governo Civil para que possa exercer o poder. Aqueles que já se utilizaram de uma procuração, entendem a responsabilidade que é usá-la e/ou concedê-la a alguém. Geralmente, na própria procuração vem uma limitação de poderes, isto é, aquele que tem a carta de procuração deve agir dentro das limitações constantes na própria procuração. Porventura, alguém imagina que Deus entregou uma procuração ao Governo Civil e disse “Faça o que bem entende?”.

A entrega de uma procuração implica em termos de limitação de autoridade, então devemos trazer a baila que a concessão de poderes para atuar situa-se dentro da vontade daquele que concede a procuração.Onde encontramos as regras que regem a procuração que Deus entregou ao Governo Civil? Ora, não podemos imaginar que Deus regulou todas as coisas inerente a salvação e pensou em cada detalhe da criação e ao mesmo tempo entregou os homens ao seu bel prazer no que concerne à vida em sociedade. Ademais, uma análise da lei civil dada aos judeus (excetuando-se o conteúdo cerimonial) deverá nos levar à indagação se aquela lei é temporal ou se é uma revelação da vontade e, consequentemente, do próprio caráter do Criador. No caso de considermos ser ela temporal, devemos afirmar onde e quando perdeu sua vigência sob pena de estamos negando a suficiência e plenitude das Escrituras e se consideramos como sendo revelação do caráter do Criador, então devemos deduzir que a Lei Civil existe não apenas como mandamento, mas como verdade existente no coração do Eterno Deus.

O tempora! O mores! Até aqui, muito tivemos a pensar. Oh tempos! Oh costumes! Não creio que haja algo mais perigoso do que tentar substituir a Lei de Deus pela lei humana. Alguém duvida da corrupção do coração humano? Uma vez que Cristo nos diz que não se produz bons frutos a partir de árvores más, poderíamos esperar que um coração corrupto produzisse leis justas e santas? Triste é ver os cristãos cuspindo sobre a lei civil exposta nas Escrituras, mas o fato é que mesmo quando o povo de Israel foi rebelde e Deus ter constituído Saul como rei de Israel, Israel não deixou de ser governada pelos preceitos de Deus, sendo que a quebra dos mandamentos de Deus ensejou a tomada do poder das mãos de Saul e, posteriormente, a morte do mesmo.Ousaríamos dizer então que Deus não governa inclusive sobre o governo Civil ou seremos idiotas de dizer que 'Deus reina sobre todas as coisas, mas sobre o governo civil não'?

“Quando os justos governam, alegra-se o povo; mas quando o ímpio domina, o povo geme.” (Pv 29:2)

Justiça é, na visão de Hans Kelsen, seguir aquilo que está na lei e ouso me utilizar do pensamento dele e dizer que justo é seguir o que está na Lei de Deus, pois apenas esta não é enleivada do vício do pragmatismo e relativismo moral, antes é enleivada da mais Santa e Pura vontade que é a do Criador. Enquanto as leis de Deus não forem seguidas à risca, teremos que gritar espantados “Que tempos e que costumes!”.

E sobre o aborto?

Apesar de muito ter me estendido ao analisar a concepção de estado anômico, ter feito uma pequena análise dos votos dos ministros do STF e o dever do Governo civil em todas suas esferas, cabe agora ir ao ponto devido, objeto de estudo deste texto. Ora, como já disse, reconheço ter me delongado em minhas considerações preliminares, e alguns poderão dizer “Renan, não se escreve tanto para um blog”. Aos indivíduos que me reprimem por escrever tanto, informo que não sou escritor poeta, eu prefiro escrever textos com um desenrolar coerente e metódico... há muito tempo escapei da tentativa de ser rápido e deixar pontos soltos aguardando que alguém conseguisse compreender minha linha de raciocínio.

Mas seguindo ao que interessa, precisamos entender que, do ponto de vista jurídico, precisa-se definir o momento em que se inicia a vida. O Código Civil, em seu Art. 2º afirma que “A personalidade Civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. Aqueles que afirmam que o feto não é uma vida para o governo brasileiro estão parcialmente corretos. Eles não possuem direitos, possuem apenas a garantia de que seus direitos serão protegidos após ele nascer e uma vez que ele é um cidadão brasileiro em potencial, então ele não pode ser morto no ventre da mãe, ao menos em situações normais. Essa teoria adotada pelo Código Civil brasileiro é chamado de “Teoria natalista”, este é o motivo pelo qual o Código Penal, em seu art. 128, permite o aborto nos casos de perigo de vida para a gestante e/ou se a gravidez resulta de estupro e agora, graças à infeliz decisão do STF, é permitida no caso de anencefalia.

Então não precisamos ir muito longe para percebermos que “gente” é apenas aquele que nascer com vida, em nosso ordenamento jurídico. Então está tudo certo? De forma alguma. Como eu disse anteriormente, a Lei civil está submetida e/ou flui da autoridade divina, logo, a revelação escriturística é de maior autoridade na decisão sobre o tema aborto. Devemos nos questionar: É o feto uma vida? Alguns dizem que uma semente não é uma vida e que uma pedra não é uma casa. Concordo com eles. Como eles dizem, uma semente não é uma vida, mas erram no argumento seguinte, pois se a semente não é uma vida, o broto o é. Eu não creio que o sêmen seja uma vida, mas creio que o óvulo fecundado o é e prova disto é que o óvulo fecundado possui capacidades multiplicativas, coisa que o sêmen não possui de per si.

Se um óvulo fecundado se multiplica, há uma força que o leva a isto. Para o cético é um processo natural, para um cristão é obra divina  (Sl 139:14-16). Se consideramos que é Deus quem está operando esse processo multiplicativo, interrompê-lo é contender contra Deus em sua Obra e se o processo é natural, entende-se que a força que o leva à multiplicação é uma força interna e é oriunda da própria vida que já existe. Por um lado ou pelo outro, considera-se que há vida. Para o cético, não há como negar tal existência de vida de per si, pois negá-la é reconhecer a existência de Deus e para o cristão não é possível apoiar o aborto, pois apoiar é negar que aquela substância é resultado da operação divina e que Deus está trabalhando em algo que não possui qualquer valor.

Na mesma linha, percebe-se que independe das qualidades que resultam da multiplicação celular, pois os olhos azuis e negros são formados pela mesma mão (ou força, depende se você é cristão ou cético), logo o valor de ambos é igual. Surge então o questionamento: Renan, não podemos comparar aborto de anencefalos com cor dos olhos! E eu afirmaria que essa contra-argumentação foi falaciosa, haja visto que se vivessemos na Alemanha nazista, ser negro seria o mesmo que nascer com anencefalia, a repulsa seria semelhante. Mas alguém, nos dias atuais consideraria em abortar por imaginar que seu filho pode nascer negro? Óbvio que é apenas um exemplo hipotético, mas suficientemente forte para que se compreenda que defeito nem sempre é o que é ruim, mas sim o que nos é inconveniente ou não nos é útil e essa utilidade está envolvida em um juízo de valor próprio da época. Novamente, note que se este juízo de valor é próprio da época, o é por causa da anomia, do relativismo.

Alguns poderão alegar que a criança viverá apenas algumas horas, mas ainda que ela viva apenas algumas horas, não tem ela este direito? Então nem o STF respeitou à lei,pois a lei diz que o direito à vida é garantia fundamental e então adentra-se novamente em um campo cheio de relativismos. Por que estes relativismos? Simplesmente porque rejeitaram a Lei de Deus como padrão eterno pelo qual todas sociedades deve ser regulada. Logo, não tenho medo de afirmar que abrir espaço para o aborto é uma grande inconstitucionalidade e o STF, guardador da Constituição, é aquele que a rasga em vários pedaços.

E no caso de aborto por estupro? Esta é apenas mais uma prova de que o feto não é reconhecido como pessoa. Explico: em nosso ordenamento jurídico, o filho não pode responder penalmente pelo crime do pai. Cada um é indepente e responsável por si, logo se meu pai roubar, por exemplo, eu não posso ser preso no lugar dele. Como o profeta Ezequiel diz (cap. 18), o pai não deve pagar pelo pecado do filho e nem o filho pelo pecado do pai, no entanto, o Direito Penal brasileiro admite que um feto, uma criança pague pelo pecado do pai, o estuprador. Ele não apenas paga pelo pecado do pai, mas paga de forma pior, pois é condenado à morte, morte que é proibida em nosso ordenamento como forma de pena.  Infelizmente, os nossos juízes usam balança enganosa e aceitam suborno, os nossos sacerdotes já se venderam aos poderes deste mundo, não vivemos no melhor lugar da terra, mas enquanto seguirmos a Deus, temos certeza que Ele cuidará do seu povo.  Eu não tenho dúvidas de que o mundo ainda não se destruiu porque Deus decidiu manter muito de sua lei nos ordenamentos jurídicos dos povos, mas se Ele decidisse entregar os povos às suas depravações, sem que qualquer freio fosse imposto, viveríamos em um mundo muito pior. Que Deus tenha misericórdia de nós e nos motre como somos incoerentes ao afirmar que “amamos um estado laico”. Para encerrar, finalizo citando mais um trecho do sábio voto proferido pelo Ministro Cesar Peluzo contra a liberação do aborto de anencéfalos:

“Ao feto, reduzido no fim das contas à condição de lixo ou de outra coisa imprestável e incômoda, não é dispensada de nenhum ângulo a menor consideração ética ou jurídica nem reconhecido grau algum da dignidade jurídica que lhe vem da incontestável ascendência e natureza humana. Essa forma de discriminação em nada difere, a meu ver, do racismo e do sexismo e do chamado especismo. Todos esses casos retratam a absurda defesa em absolvição da superioridade de alguns, em regra brancos de estirpe ariana, homens e ser humanos, sobre outros, negros, judeus, mulheres, e animais. No caso de extermínio do anencéfalo encena-se a atuação avassaladora do ser poderoso superior que, detentor de toda força, infringe a pena de morte a um incapaz de prescindir à agressão e de esboçar-lhe qualquer defesa.

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