As mulheres nas Assembleias religiosas: Do uso do véu.

Renan Almeida
“Todo homem que ora ou profetiza com a cabeça coberta desonra a sua cabeça. Mas toda mulher que ora ou profetiza com a cabeça descoberta desonra a sua cabeça, porque é a mesma coisa como se estivesse rapada.” (I Co 11:4-5)

Proponho-me a analisar o capítulo 11, mais especificamente os versos 1 ao 16, da primeira carta do apóstolo Paulo aos cristãos da cidade de Corinto que, de forma específica, trata do comportamento das mulheres nos culto e da necessidade da utilização do véu.

Ao discorrer acerca do assunto, tenho ciência das dificuldades no trato do mesmo, no entanto tenho a pretensão de demonstrar que a dificuldade é muito mais fruto de uma mente “secularizada” do que fruto de uma minuciosa análise bíblica das questões aqui suscitadas.

Da possibilidade de se conhecer a verdade

Ouso afirmar que a criação deste tópico específico é dispensável, no entanto, se o elenco, o faço a fim de responder às mentes mais inquietas e que se puseram a ler o texto com seus conceitos prontos e irrevogáveis. Conheço algumas mentes receosas que muitas vezes se põem na leitura de um texto visando refutar seu conteúdo sem nem mesmo analisá-lo e que fazem suas análises teológicas fundadas no velho argumento da “cultura”.

Inicialmente devemos ter em mente que há a possibilidade de se conhecer a verdade. Do conceito de verdade depende nossa existência, haja visto que apenas a possibilidade de se conhecer a verdade nos permite saber que existimos e que algo além de nós existe ou, de outra forma, não poderíamos ter certeza que somos ou que algo existe além de nós e mesmo a ilusão poderia ser inexplicável já que não poderíamos conhecê-la como certa em qualquer nível.

Reconheço que aqui foi estabelecido um pequeno paradoxo de cunho filosófico, mas talvez sem esse paradoxo, as mentes mais “culturais” não fossem capazes de compreender os aspectos relacionados ao uso do véu que serão expostos em seguida. A fim de simplificar, o que estou a dizer é que 1) A verdade existe 2) É possível conhecer o que é verdadeiro 3) A afirmação da existência de algo implica na existência de um algo que seja referenciado (nível menor) ou que seja referencial (um absoluto, um algo maior).

Se sabemos que podemos conhecer a verdade, devemos buscá-la, pois aceitar menos que a verdade é aceitar uma mentira e esta não é uma atitude coerente para o filósofo ou  para o analfabeto, para aquele que mora no palácio ou para aquele que mora em um barraco. O conceito de mentira apenas existe porque existe o conceito da verdade, sendo a verdade o conceito absoluto pelo qual a mentira é julgada.

Se a mentira é julgada com base na conformidade (ou desconformidade) que mantém com a verdade, então nada mais justo do que buscarmos a verdade. Para um cristão, Cristo é a verdade suprema e as Escrituras são a revelação perfeita de seu caráter e vontade, sendo esta a definição e o absoluto pelo qual todos os “pontos finitos” devem ser julgados.

Considerações gerais e necessárias.

O apóstolo Paulo ao fazer a “ponte” para adentrar no assunto faz menção à imitação de Cristo, pondo-se como exemplo a ser seguido. Este deve ser um aspecto a ser considerado e não tido como parte de somenos no texto em análise. Por qual motivo o apóstolo fazia a já referida e tão conhecida menção “sede meus imitadores assim como eu sou de Cristo” (I Co 11:1)? Ao olharmos para os evangelhos, perceberemos que Cristo viveu uma vida ímpar em não poucos aspectos, principalmente em sua humildade e amor para com o próximo, e, deve-se salientar, que ele era um rigoroso seguidor das Escrituras, chegando ao ponto de dizer que “passariam os céus e a terra, mas não cairia nem um “I” ou um “til” até que todas as coisas estivessem cumpridas” (Mt 5:17-18)

O que Paulo fez foi lembrar aos cristãos daquela cidade que em tudo havia ele procedido conforme a verdade da revelação que houvera recebido, nunca se apresentando com palavras de sabedoria humana, mas sim como portador e anunciador de todas as verdades de Deus, do mistério da graça revelado aos gentios (I Co 2:4). Se partimos do pressuposto de que a Bíblia é a Palavra de Deus e que o apóstolo Paulo falou em demonstração de Espírito e Poder, então devemos considerar também que o capítulo em análise é plenamente inspirado.

Após a menção da imitação de Cristo, o apóstolo menciona que os cristãos de Corinto sempre se submetiam às orientações, preceitos que o apóstolo os ensinava. Ora, essas argüições iniciais, se me é permitido “especular”, parecem levar a crer que o assunto poderia causar alguns “transtornos” naquela igreja, talvez Paulo suspeitasse que o mesmo não fosse ser aceito, sendo que por isto ele os lembra da submissão que haviam apresentado até aquele momento aos ensinamentos do apóstolo Paulo que, salienta-se, eram palavras plenamente inspiradas.

Cristo é a cabeça de todo homem

Nem todas as pessoas estão acostumadas com o conceito de “pressupostos”. O conceito de pressuposto, de forma simplificada, é o ponto de partida necessário que pode alterar todo o seu percurso. Um exemplo de pressuposto é 2+2 que sempre e invariavelmente terá o 4 como resultado, mas nem sempre o 4 implicará no resultado de 2+2, podendo ser o resultado de 3+1, 4-0 e outras contas semelhantes. Conforme já disse,  em grosso modo, o pressuposto é a “tese central”, o ponto de origem do seu ponto de pensamento. O pensamento de qualquer indivíduo, para que faça algum sentido, parte de um pressuposto que o leva a um resultado específico e este pressuposto deve sempre estar explicito ou ser facilmente dedutível.

O apóstolo Paulo, no verso 3 suscita a tese sobre o qual todo seu argumento será construído, isto é, “Cristo é a cabeça de todo o homem, o homem a cabeça da mulher e Deus a cabeça de Cristo” (I Co 11:3). A forma como o apóstolo constrói a base é no mínimo curiosa, haja visto que ele converte 3 pressupostos em 1 pressuposto universal e interligado de tal modo que a negação de qualquer um dos pressupostos implica na negação do outro pressuposto. A negação de que o homem é a cabeça da mulher implica automaticamente na negação de que Cristo é a cabeça do homem. Este é o ponto de origem de toda a construção do argumento acerca do uso do véu e que deve ser posto diante dos olhos antes que se apele para o antigo e ineficaz argumento cultural.


Dos desdobramentos inerentes ao pressuposto

Após o apóstolo Paulo lançar diante dos nossos olhos a verdade da relação existente entre Deus Pai e Deus Filho, Deus Filho e o homem, homem e mulher, prossegue afirmando que todo homem que ora ou profetiza com a cabeça coberta desonra a sua própria cabeça, mas que a mulher que o faz com a cabeça descoberta também desonra a própria cabeça. O versículo tem por objetivo deixar bem claro que o seu alvo é a doutrina cristã e não aspectos culturais e isto é melhor percebido se olharmos para o fato de que Paulo se dedica extensamente a ensinar ao povo de Corinto como deve se comportar no culto público e acerca dos aspectos litúrgicos básicos que devem reger os mesmos, sendo que os ensinamentos “gerais” seguem dos capítulos 10 (no qual trata dos aspectos da idolatria) até o capítulo 14 (acerca de como a igreja se deve portar no uso dos dons).

A alegação de que Paulo faz menção direta à cultura é facilmente desconstruída quando observamos que se o uso do véu fosse uma questão cultural, a própria cultura trataria de corrigir às mulheres. Alguém considera que o marido de qualquer uma daquelas mulheres não as corrigiria e não ordenaria ao uso do véu se a sociedade tivesse tal cultura? Se houvesse tal cultura na cidade de Corinto, haveria qualquer necessidade de o apóstolo Paulo corrigir às mulheres, haja visto que os próprios maridos e familiares corrigiriam? Na verdade, o que havia era uma questão persistente e que não era de qualquer forma reprimida pela sociedade, mas que para o apóstolo Paulo era de suma importância, de importância tal a ponto de ele fundamentar a existência da obrigatoriedade na própria relação entre Deus Pai e Cristo e, por fim, Deus e o homem e Homem e mulher.

Por que o homem não deve cobrir a cabeça e a mulher tem tal obrigação? O apóstolo responde que o homem não deve cobri-la por ser a imagem e glória de Deus, mas a mulher deve cobrir por ser a glória do homem (I Co 7:11). Aqui surgem os clássicos argumentos culturais próprios das “revoluções” feministas e movimentos neopentecostais que enxergam um toque cultural onde não existe, no entanto, perceptível é o fato de que o apóstolo usa um novo argumento para a obrigatoriedade da utilização do véu (ele fala em “DEVER”), isto é, a ordem da criação. Dos versos 7-10. Ele desenrola o mistério da criação e a importância da criação como causa capaz de explicar a necessidade de utilização do véu pelas mulheres nas comunidades cristãs e, de forma mais específica, quando orarem e/ou profetizarem.

O que dizer do respeito aos anjos? Este é um daqueles pensamentos paulinos que não são fáceis de explicar, mas tendo em vista á referência que ele faz à glória de Deus, há a possibilidade de ele estar estabelecendo uma comparação com os anjos e o seu proceder na presença de Deus, isto é, cobrirem os pés e a face, em sinal de total reverência ao Eterno Deus (Is 6:2,3). Se a raça humana foi feita um pouco menor que os anjos, por que a referida raça não demonstraria sua reverência de forma também tão específica?

Entendo que alguns  tem levantado o questionamento se os homens e mulheres são iguais, no entanto esta mentalidade é fruto de um conceito feminista e pós-moderno na interpretação das Escrituras. O apóstolo Paulo também define o papel da mulher como complementar, mas não intercambiável. Ainda que ela seja companheira do homem, a dignidade em glória não corresponde à deste último. Ao falar isto não estou me referindo a qualquer suposição da existência de um “direito” de homens humilharem mulheres, mas sim ao fato de que estes receberam de Deus algumas honraria específicas. Deus definiu papéis para o homem e para a mulher. Papéis complementares, mas não intercambiáveis (I Co 11:9.10 ; I Tm 2:9-15; Gn 3:16-17).

Acima de quaisquer conceitos humanistas e pós-modernos que possamos suscitar, o fato é  que as Escrituras são a verdade, o absoluto ao qual devemos nos submeter.

No meio jurídico há o conceito do “Direito natural”. O conceito de Direito Natural afirma que o direito vem de Deus, tem sua origem na divindade e que está acima de qualquer lei humana e que os homens, como que “automaticamente” conseguem discernir o correto do errado graças à semente plantada em cada um. O apóstolo Paulo, se me é permitido fazer tal comparação, invoca a existência do Direito natural quando diz “julguem vocês mesmos se é conveniente que as mulheres orem com a cabeça descoberta” e prossegue “porque a mesma natureza vos ensina que é vergonhoso o homem ter cabelo crescido” (I Co 11:13-14). Ele considerava desnecessário grandes argumentos e se o faz é porque os cristãos se recusavam a julgar imparcialmente a questão, preferindo “achar algo” acerca do assunto. Necessário é lembrar que Paulo para desenvolver o argumento, fundamentou-se em 4 premissas básicas, tendo unificado 3 delas em uma única premissa absoluta e indissolúvel 1) Deus é a cabeça do homem, O homem é a cabeça da mulher e Deus é a cabeça de Cristo e, por fim, 2) A natureza, a ordem da criação, aponta para o fato de que as coisas devem ser tais como o apóstolo estava a ensinar.

Até o momento foi feita uma análise geral até o verso 14 do capítulo 11, mas surge agora o versículo 15 que é o versículo preferido daqueles que defendem o argumento cultural. “O cabelo foi dado em lugar do véu”. O problema de usar este argumento para contrariar a obrigatoriedade da utilização do véu nos cultos pela mulher é que o teólogo demonstra ser assíduo leitor de mangá, haja visto que ele lê as Escrituras de “trás para frente” e não na ordem sucessiva dos argumentos apresentados, coisa que de per si  é incoerente.

O apóstolo foca, conforme já foi explicado no início do texto, nas questões concernentes à liturgia, se é que posso me referir desta forma no presente caso, e ao discorrer acerca dos aspectos litúrgicos, reiteradamente orienta que as mulheres “orem e profetizem com a cabeça coberta” e repentinamente ele coloca o cabelo como substitutivo do véu. Estaria ele sendo incoerente? No entanto, o apóstolo se refere ao cabelo no lugar do véu em aspectos cotidianos, não em aspectos litúrgicos.

A comparação que Paulo estabelece tem fulcro no próprio verso 6 que, trocando em miúdos, seria algo como “mulheres, assim como vocês teriam vergonha se fossem carecas, então tenham vergonha de orarem ou profetizarem sem se cobrirem”. A questão suscitada por Paulo não é substituição, mas sim “Se você entende que seus cabelos são tão preciosos, saiba que o véu o é de igual modo”. Não há substituição, mas sim comparação e a leitura de um único verso para contraditar todos os versos anteriores é a demonstração de que você pode ser um leitor de mangás ou, no mínimo, não entende a harmonia existente em todos os textos bíblicos.

A finalização do argumento Paulino, no que concerne à utilização do véu, é “se alguém quiser ser contencioso, nós não temos tal costume, nem tampouco as igrejas de Deus”. O termo contencioso é um termo muito amplo, mas que pode significar “litigioso”, “duvidoso”, “contestador”, ou seja, o Apóstolo Paulo deixa claro o assunto não estava posto em uma pauta de discussões a fim de saber se todos eram unânimes naquele entendimento, mas sim que tinham por obrigação serem concordes. Ademais, o apóstolo menciona igrejas no plural, parecendo indicar que ele tem em mente as congregações locais, logo perceptível é que a utilização do véu era questão pacificada nas demais congregações e que a igreja de Corínto ainda prestava resistência no discernimento da questão, necessitando por isto da correção.

A utilização de “igrejas” (plural) faz jus ao entendimento de igreja enquanto congregação local no texto em análise, demonstrando que havia uma certa uniformidade no meio do povo de Deus. Conforme já demonstrado, esta uniformidade existia porque os cristãos das demais localidades compreendiam os pressupostos que fundamentavam a utilização do véu e que a negação do véu para as mulheres implicaria na negação dos pressupostos da Soberania de Deus (Cristo é a cabeça do homem, o homem é a cabeça da mulher, Deus é a cabeça de Cristo).

Em todo o tempo mantive diante dos meus olhos os problemas de interpretação que alguns poderão alegar, apelando novamente para o argumento cultura. Acerca deste argumento, voltarei a falar logo, antes desejo  dizer que comungo do pensamento do missionário Jim Elliot (in memorian) que diz:

“O cerne da questão está em se Deus revelou ou não um padrão universal para a igreja no Novo Testamento. Se Ele não o fez, então algo deve ser feito até que funcione. Porém, estou convencido de que algo tão caro ao coração de Cristo como a Sua noiva, jamais seria deixado de lado sem instruções explícitas sobre sua conduta comunitária. Estou ainda mais convencido que o século 20 de forma alguma imitou os padrões Dele em seus métodos de congregar a comunidade como igreja... é meu compromisso, se Deus tem padrões para a igreja, encontrá-los e estabelece-los, seja a que custo for” (Shadow of The Almighty: Life and Testimony of Jim Elliot).

Da fraqueza do argumento cultural

Inicialmente, eu ouso afirmar que o argumento cultural é dos mais fracos que podem ser elaborados pela mente humana, pois usa um “estudo da história” como superior à análise textual das Escrituras, quando na verdade a análise histórica deve vir apenas quando a Bíblia deixa alguma lacuna, sendo então possível a utilização de subsídios extras, desde que os mesmos não se ponham de forma contrária às Escrituras.

No que concerne ao argumento cultural, o mais famoso é, sem dúvidas, o argumento de Henry Halley que conseguiu difundir seu entendimento “cultural” por meio do seu “Pequeno Manual Bíblico”. Vejamos qual o argumento empregado por ele:



A utilização do argumento cultural é ótima, haja visto que consegue dizer aquilo que o apóstolo Paulo não disse, de forma que as mentes mais secularizadas e pós-modernas consigam desviar a atenção do argumento empregado no capítulo em comento.

Henry Halley afirma que as cidades gregas e orientais estavam cheias de mulheres devassas e que o véu era para diferenciar às mulheres cristãs. A questão que eu suscito é: de onde Halley retirou esta informação? Se o argumento de Halley for levado a sério, estaremos reescrevendo a Bíblia, pois estaremos dizendo que Paulo disse “Que a mulher deve ter sinal de poderio sobre sua cabeça para serem diferentes das meretrizes”, quando na verdade ele, salienta-se, fundamenta sua argumentação na Soberania de Deus e no fato de que “Deus é a cabeça do homem; homem é a cabeça da mulher e Deus é a cabeça de Cristo”.

Além do mais, é nítido que Halley faz conjecturas excessivas fundadas em probabilidades e não na comparação de versículos. Se Halley estivesse correto, seria mais coerente que Paulo falasse a finalidade tal como supostamente era e não como foi apresentada.

Halley menciona que as mulheres mais velhas retiravam o véu na igreja e afoitavam as mais novas, no entanto este argumento é plenamente descabido e infundado. Se as mulheres mais velhas retiravam o véu e as mais novas ficavam “apavoradas”, então devia ser uma questão  pacificada culturalmente, isto é, todas as mulheres deviam saber da obrigação de usar o véu, mas se fosse uma questão cultural, por que os maridos mesmos não corrigiram as esposas? Ora, ou é cultural ou não é. Se for cultural e de tamanho valor, então as mulheres seriam corrigidas por seus familiares e pelo próprio marido, no entanto, Paulo não faz menção a qualquer pessoa que esteja se incomodando com aquela atitude, antes afirma que o erro se situa na negação de “a mulher ser a glória do marido” e nos demais pressupostos enfileirados.

Da tradição

Até aqui, de forma generalista, tratei dos aspectos espirituais e “litúrgicos” do véu, sendo que agora desejo me aprofundar no aspecto “litúrgico-histórico” e fazer uma rápida análise da tradição cristã.

católica ortodoxa com véu eslavo
O que o argumento cultural faz é  basicamente 1) demolir o argumento Paulino na medida em que substitui por argumentos culturais 2)  tem a pretensão de demonstrar que igrejas antigas sempre estiveram erradas na forma como enxergam o assunto. Obviamente a antiguidade não faz a verdade, mas é interessante observar que muitas das igrejas antigas interpretam I Co 11 literalmente e seguem as ordenanças ali contidas. São bons exemplos do que estou dizendo: católicos romanos, católicos ortodoxos, alguns anglicanos, grupos presbiterianos, alguns luteranos, ramos reformados de tendências puritanas e grupos independentes de linha mais atual, como por exemplo, Congregação Cristã do Brasil.


Me parece um tanto claro que as igrejas modernas com seu argumento cultural estão mais propensas a errarem neste aspecto, ainda que acertem em outros. Sou levado a crer nisto pelo fato de nenhuma igreja contrária à utilização do véu ter sido capaz de provar apenas pelos argumentos paulinos de que o véu é questão de somenos.


Das incoerências exegéticas

Acerca dos métodos interpretativos das Escrituras, temos dois métodos básicos e muito bem difundidos 1) método gramático histórico 2) método de análise crítica. Reconheço a existência de outros métodos, tal como o método alegórico de interpretação, no entanto este para o caso em questão se faz irrelevante.

O método gramático-histórico busca o sentido real do texto para o período em que foi escrito, para as pessoas a quem foi escrito, estilo do texto e como aquilo é aplicado aos nossos dias. O método gramático-histórico entende ser as Escrituras Sagradas Eternas e infalíveis e pela sua eternidade, é também contemporânea, ou seja, verdades antigas permanecem atuais.

Por outro lado, o método de análise crítica é essencialmente liberal, pois parte do pressuposto de que pode haver erros nas Escrituras e que esses erros devem ser corrigidos. Logo, se eu não gosto de um texto específico, posso criar argumentos tentando invalidar o texto bíblico e colocar no lugar um boneco de cera. É extremamente racionalista e não crê na infalibilidade da Bíblia. Este método se divide em alta crítica e baixa crítica, mas tal subdivisão é irrelevante também neste caso. Apresento ambos apenas de forma geral a fim de que seja facilmente compreensível a análise que segue:

O Apóstolo Paulo utiliza o mesmo argumento da ordem da criação para tratar de 3 (três) assuntos específicos, a saber:

1. O homossexualismo é pecado porque posiciona-se contra a obra de Deus na criação (Rm 1:26-29)

2. Mulheres não devem ser pastoras por causa da ordem da criação, isto é, na criação ela foi posta como auxiliadora. (I Tm 2:12-14)

3. A mulher deve usar o véu porque ela veio do homem, isto é, novamente a criação é usada na argumentação Paulina. (I Co 11:1-16)

A questão é que todos os cristãos (aqueles que ainda são considerados ortodoxos) têm sido unânimes no fato de que o homossexualismo é pecado e o fazem porque a Bíblia diz claramente que é pecado (Método de interpretação gramático-histórico). Entendem que era pecado no passado e permanece sendo pecado hoje.

Quando entramos na questão do pastorado feminino, percebemos que os entendimentos se dividem. Alguns entendem que a igreja de Cristo pode ter pastoras (método crítico) e outros entendem que não deve haver pastoras (Método de interpretação gramático-histórico).

E por fim, quando se trata do uso do véu, a grande maioria se utiliza do Método Crítico de interpretação das Escrituras, apresentando sérias divergências com a doutrina ali exposta.

Isso faz com que me surjam sérias dúvidas e uma delas é:

Imaginemos um cristão da linha reformada e que, obviamente, afirma que o homossexualismo é pecado (Método de interpretação gramático-histórico) e que mulheres não devem ser pastoras (Método de Interpretação gramático-histórico). Como ele faz para negar a necessidade da utilização do uso do véu? Quando ele nega a obrigatoriedade do uso do véu se utiliza do Método de interpretação crítico. Qual coerência há nesta atitude? É algo a se pensar, pois demonstra que o sistema teológico deste indivíduo tem areia demais em algum lugar onde deveria ter mais cimento.

Conclusão

Creio não haverem melhores palavras para encerrar este curto texto senão as palavras do Arcipreste Alexis Peña Alfaro da Igreja Ortodoxa da Sérvia no Brasil:

“Neste sentido, podemos afirmar que o véu tem necessariamente um sentido e dimensão que ultrapassam o uso cultural ou qualquer distinção discriminatória para com o sexo feminino. Por que reduzir o mistério a simples categoria sociológica, histórica, sexual ou cultural Por que se adotam interpretações racionalistas e materialistas a uma dimensão que ultrapassa o tempo e o espaço? Ou o Sagrado está para além do concreto ou não existe? O Sagrado evidentemente se expressa e manifesta no mundo, mas está além dele! Aqui começa a distinção entre a recusa do véu, numa interpretação simplista e exterior ou a segunda opção apresentada pela Ortodoxia: viver o significado do véu dentro do universo do Rito Litúrgico, cujo sentido está evidentemente para além do uso do objeto "véu", fazendo deste um mero fim sem sentido.”

E, por fim, fazer ecoar as palavras do apóstolo Paulo quando diz “Mas, se alguém quiser ser contencioso, nós não temos tal costume, nem tampouco as igrejas de Deus.” (I Co11:16).

Soli Deo Gloria

Comentários

  1. Parabéns Renan pelo seu comentário sobre "uso do véu", o qual não carece de nenhum reparo, pois expôs o assunto com muita propriedade e reverência, sobre o qual concordo em gênero, número e grau.

    A mulher DEVE usar véu nas reuniões litúrgicas para orarem e/ou profetizarem, bem como ter cabelos crescidos, pois calvície(natureza - I Cor. 11:14) é próprio dos homens e não das mulheres. Tudo isso, portanto, é um assunto encerrado/claro para os que lêem as sagradas escrituras pela lente da verdade/justiça e não pela lenta da "cultura" e da mediocridade.

    Fabiano - Itapecerica da Serra/SP. fabianofranca31@hotmail.com

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  2. Eu gostei muito do texto, bem escrito e bem aparado bíblicamente, muito embora como presbiteriano reconheço que a IPB adotou o modo cultural de ver o texto, indo de encontro com o que o Santo Apóstolo afirma. Mas há uma pergunta, é justamente o verso 5:"Toda mulher, porém, que ora ou profetiza com a cabeça sem véu desonra a sua própria cabeça, porque é como se a tivesse rapada". Enquanto no Cap.14 Paulo afirma que essas mulheres deveriam está em silêncio, mais uma vez, o argumento dele, não é outro senão, a lei da criação: "também a lei o determina" (1Co 14.34).

    Lendo o comentário de 1 Co de David Prior da ABU ele afirma que as mulheres poderiam orar e profetizar desde quando estivessem com a cobertura, mas o mesmo se contradiz totalmente com cap. 14. Então como ser coerente com verso 5? Significa que as mulheres poderiam participar do culto na oração corporativa e participar da pregação? Haja vista que não há sacerdotisa nas Escrituras.

    Aguardo!

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  3. Gunnar Vingren,

    Obrigado pelo seu comentário e entendo a aparente contradição. Primeiramente precisamos pontuar que a palavra "profecia" não pode ser, em nenhuma hipótese, limitada ao ato de pregar a palavra, mas mantém também relação com o dom de profecia descrito por Paulo em I Co 14.
    Quando analisamos as Escrituras e a história da igreja, vemos que o dom de profecia/profeta não é ministério de ensino, mas sim um "ministério reserva". O profeta não é alguém que tenha autoridade "presbiterial" sobre a congregação. Não sei se consigo me fazer entender neste aspecto, mas caso não tenha entendido, me diga e tentarei explicar este ponto de uma outra forma.
    Se você percebe que "profecia" não é apenas o ministério de ensino como reformados mais tradicionais têm tentado fazer, você quebra a contradição. Por que? Quando lemos as Escrituras vemos que Felipe tinha 4 filhas que eram profetizas, sendo que essas 4 mulheres não eram profetizas no sentido de que ADMINISTRAVAM A PALAVRA ou tinham AUTORIDADE NA CONGREGAÇÃO, mas sim no sentido de que elas possuíam o dom de profecia. Os dons de carisma, as Escrituras não demonstram qualquer óbice relacionado ao gênero (masculino ou feminino). A Bíblia apresenta restrições de gênero no que se refere aos dons de diakonia (dons de serviço, tais como o pastorado, diaconato, etc).
    No que se refere a I Co 14:5 e a aparente contradição com I Co 14:34, me permita utilizar um pouco da minha vivência jurídica. Em direito penal aprende-se um conceito de "tipo penal". No tipo penal você lê o Art. e verifica se TODAS as características da prática de um individuo são compatíveis com aquele Art. Entender isto é importante para percebermos que I Co 14:34 e I Co 14:5 nao são textos incompatíveis e digo o motivo:

    No verso 5, Paulo não está dizendo que quer que todos falem na igreja ou quando bem entendem. Quando ele diz "quero que todos vós faleis" significa que todos, sem exceção, devem buscar os dons e ele espera que todos recebam os mesmos. Como mencionei anteriormente, dons de carisma (9 dons descritos em I Co 12) não apresentam, no NT, restrições de sexo (homens ou mulheres).
    Quando vamos para o verso 34, note o que o texto diz:

    "As vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas, como também ordena a lei." (1 Coríntios 14:34)

    a lei determina o silêncio das mulheres? Paulo diz que sim. Mas note que o ato de falar em público é colocado em oposição ao "estar sujeitas". O problema da mulher no caso não é o falar, mas sim o falar ultrapassando a autoridade do marido. Isso se coaduna com práticas do AT, quando por exemplo, se a mulher fizesse um voto a Deus e o marido dissesse que o voto não era válido, o voto seria automaticamente anulado. A mulher não era proibida de fazer, mas caso o marido se posicionasse contrariamente, o voto era nulo. A possibilidade de a mulher falar existe, o que não existe é a possibilidade de ela ir além da autoridade. Não pode, por exemplo, ela dominar sobre o marido, exercer papéis de ensino e liderança... o único papel de ensino que pode vir a ser exercido é o extraordinário e somente quando a igreja está indo por caminhos tenebrosos e ainda assim deverá se subordinar a autoridade do marido... o homem tem a primazia.
    Não sei se consegui me fazer entender... mas qualquer dúvida, só sinalizar.

    Renan A. Moreira

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  4. Fato, mesmo querido Renan Moreira, ficou sim um pouco confuso, mas tentarei ler mais vezes para entender. Veja a explicação do pastor Filipe Machado no seu belo sermão sobre o assunto:

    "Temos o primeiro indício, nesta passagem, de que se a mulher ora ou profetiza com a cabeça descoberta (sem a devida cobertura - véu, chapéu, gorro...), isso lhe é algo vergonhoso, desonroso. Isto é tão verdade que Paulo diz que se a mulher se assenta na igreja sem a cobertura, é como se estivesse com o cabelo raspado. No versículo 15 se visualizará melhor este dito, mas o apóstolo já indica que para a mulher, o estar sem a cobertura é a mesma coisa que negligenciar a sua glória que é o seu cabelo! Quer dizer, se a mulher se porta no culto sem a cobertura, ela está voluntariamente dizendo a Deus que o seu cabelo também nada vale de coisa alguma e sequer lhe é uma glória, pois estar sem a coberta é o mesmo que estar sem cabelo que é uma glória. Noutras palavras, se a mulher assim procede, ela negligencia a glória que Deus lhe deu, porque estar sem a cobertura é o mesmo que rapar o cabelo que é sua glória.


    Há, aqui, um problema: como Paulo pôde dizer que a mulher poderia orar e pregar sendo que em 1Timóteo 2.12 ele expressamente proíbe esta prática e ordena que as mulheres fiquem "em silêncio"?

    Para compreender e destrinchar esta dificuldade, lembremos do glorioso princípio de que a Escritura não pode conter contradição; quer dizer, uma vez que a Igreja invisível (todos os verdadeiros crentes de todos os lugares) de Deus é somente uma e se rege pela mesma Palavra, a Bíblia não poderia ordenar que em determinado lugar as mulheres pregassem e em outro que ficassem caladas - até mesmo logo depois 1Coríntios 14.34 Paulo proíbe as mulheres de falarem na igreja. Assim, deve haver alguma forma de conciliarmos estas duas aparentes contradições.

    A maneira mais plausível e que não viola a harmonia bíblica é afirmar que ainda que a mulher não esteja no púlpito e/ou em frente à congregação, ela "participa" (assim como todos os presentes no local) da oração do ministro e quando o servo do Senhor prega a Palavra de Deus ela vai recebendo a mensagem e pregando para si mesma (como todos fazem), confirmando os ensinamentos e rogando ao Senhor para que lhe fale ao coração. Outro viés de entendimento também pode ser delineado a partir de que Paulo não está colocando ênfase na autorização para a mulher orar e pregar em público, mas sim proibindo-as de retirar a cobertura enquanto estiverem no culto público na presença de Deus e dos homens. Enquanto os homens demonstram sua liberdade com a cabeça descoberta, as mulheres demonstram sua submissão cobrindo-se adequadamente.

    Ainda uma terceira forma de se entender seria com relação à mulher orar e pregar apenas para mulheres, pois estas coisas juntamente com o expor do evangelho para outras pessoas do mesmo sexo (sem a presença de homens - refiro-me a algum estudo bíblico ou reunião de mulheres) é permitido pelas Escrituras.Contudo, pelo contexto da passagem esta interpretação fica mais difícil de ser sustentada - por isso nos parece ser mais verdadeira a primeira cumulada com a segunda.

    http://2timoteo316.blogspot.com.br/2012/09/serie-homem-e-mulher-os-criou-parte-23.html

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  5. A igreja qual você faz parte usa a cobertura na assembleia solene ou é algo facultativo?

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  6. Gunnar Vingren,

    Respeito o posicionamento do pastor Felipe, no entanto devo lembrar de que ele, como cessacionista, evita confrontar a expressão 'aquela que profetiza" como sendo o dom extraordinário de I Co 14 e pra isso ele transforma a expressão em "pregar". Penso que é muito mais simples de se entender este texto se adotarmos o termo "profetizar" no sentido de dom extraordinário, pois então seríamos remetidos às filhas de Felipe e a aparente contradição seria desfeita.
    Infelizmente na igreja que congrego, as mulheres não usam o véu, mas estou dando alguns passos para divulgar ao máximo esse ensinamento.

    Renan A. Moreira

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  7. Como seria visto a prática do lava-pés e do ósculo santo por você? Haja visto que algumas denominações como a CCB e Obra de Restauração tem a prática. Seria de fato cultural diferentemente da passagem de 1 Co 11, qual o princípio devemos aplicar?

    Obrigado pela resposta, e, como sou cessacionista entendo seu posicionamento. Está agora bem esclarecido.

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  8. Gunnar Vingren,

    O ósculo santo e o lava-pés me parecem práticas essencialmente culturais. O ósculo tem uma relação de "submissão", companheirismo, este é o motivo pelo qual Paulo sempre falava de ósculo santo. Quanto ao lava-pés, não há como ver como uma ordenança pelo fato de que não há uma repetição da informação nas Escrituras e nem é posto o padrão de "não vos ensina a própria natureza"? além do mais, uma análise da prática nos mostrará que geralmente, na região oriental, as pessoas adentravam a casa de outrem com os pés com pó da estrada e que os SERVOS se punham a lavar os pés a fim de que os visitantes ficassem mais a vontade. O ensinamento de Cristo não está vinculado ao "lavar os pés", mas sim "agir como servo", se submeter a outrem, agir de forma necessária, ainda que pareça humilhante.
    Muito embora eu reconheça o lava-pés como uma prática cultural, vejo que pode haver alguma utilidade dela. O problema é que se a prática não vier acompanhada do conteúdo explicativo, perde todo o sentido e se torna uma forma apenas de sujar uma toalha.

    Renan A. Moreira

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  9. Calvino o exegeta da reforma e mestre do método gramático-histórico no seu comentário sobre 1 Co 11 quanto as mulheres orarem e profetizarem diz com muita propriedade:

    "A segunda proposição é que a mulher deve manter sua cabeça coberta quando ora ou profetiza, doutra forma estaria desonrando sua cabeça. Pois o homem honra sua cabeça manifestando publicamente que é independente; semelhantemente assim procede a fim de mostrar que ele está em submissão. Por outro lado, pois, se a mulher descobre sua cabeça, ela está se desvencilhando da submissão devida, e assim demonstra, ao mesmo tempo, desconsideração por seu esposo. Pode parecer desnecessário, porém, que Paulo proíba uma mulher de profetizar com cabeça sem véu, visto que em 1 Timóteo 2.12 ele sumariamente priva a mulher de falar na igreja. Portanto, as mulheres não têm o direito de profetizar, NEM MESMO COM SUAS CABEÇAS COBERTAS, e a conclusão óbvia é que é perda de tempo que Paulo prossiga discutindoa aqui a questão do véu. A isso respondo que, quando o apóstolo desaprova uma coisa aqui, não significa que está aprovando a outra, ali. Pois quando as censura de profetizarem com a cabeça sem véu, ele não está fazendo uma concessão para profetizar, DE FORMA ALGUMA, senão que está protelando a censura contra este erro para outra passsagem (cap. 14). Esta é uma resposta perfeitamente adequada. Entretanto, pode-se adequar a situação plenamente bem, dizendo que o apóstolo espera das mulheres esta conduta modesta, não só no local onde toda a congregação se reúne, mas também em qualquer das reuniões mais formais, seja de senhoras, seja de senhores, como às vezes sucede em reuniões domésticas privativas" (CALVINO,João. Exposição de 1Coríntios. São Paulo: Edições Paracletos, 1996, p.333).

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  10. O batista Thomas Schreiner afirma o seguinte:

    "A importância deste texto para o século XX devem ser examinados brevemente. Estou sugerindo que as mulheres voltar para revestimentos de desgaste ou véus? Não. Devemos distinguir entre o princípio fundamental subjacente a um texto ea aplicação desse princípio em uma cultura específica. O princípio fundamental é que os sexos, embora iguais, também são diferentes. Deus ordenou que os homens têm a responsabilidade de liderar, enquanto as mulheres têm um papel complementar e de apoio. Mais especificamente, se as mulheres orar e profetizar na igreja, devem fazê-lo sob a autoridade da liderança masculina. Agora, no primeiro século, a incapacidade de usar uma cobertura enviado um sinal para a congregação que uma mulher estava a rejeitar a autoridade da liderança masculina. Paulo estava preocupado com coberturas de cabeça só por causa da mensagem que enviou para as pessoas em que a cultura".

    Do outra lado, temos o Dr. Augustus Nicodemus Lopes, escrevendo sobre Ordenação Feminina no Novo Testamento, ele afirma:

    "O ensino de Paulo se aplica hoje?
    Evidentemente, os igualitaristas têm procurado se livrar das implicações desta passagem, e tentado alternativas quanto à sua interpretação. Na verdade, alguns simplesmente se recusam a trazer a passagem para o debate alegando que o problema que levou Paulo a dizer o que disse foi causado pela cultura da época, e pelas circunstâncias da cidade de Corinto. Outros ainda insistem que Paulo estava influenciado pela cultura patriarcal da sua época, que suas palavras são condicionadas culturalmente, e portanto, inadequadas para as culturas e sociedades posmodernas do fim do século XX.

    Existem algumas deficiências com estas tentativas. Primeira, não fazem a distinção entre o princípio teológico supra cultural e a expressão cultural deste princípio. Enquanto que o uso do véu é claramente um costume cultural, ao mesmo tempo expressa um princípio que não está condicionado a nenhuma cultura em particular, que é o da diferença fundamental entre o homem e a mulher. O que Paulo está defendendo é a vigência desta diferença no culto público — o véu é apenas a forma pela qual isto ocorreria normalmente em cidades gregas do século I.

    Segunda, Paulo defende a participação diferenciada da mulher no culto usando argumentos permanentes, que transcendem cultura, tempo e sociedade, como a distribuição ou economia da Trindade (1 Co 11.3) e o modo pelo qual Deus criou o homem (1 Co 11.8-9).

    Acresce ainda que Paulo defende o uso do véu em Corinto apelando para o costume das igrejas cristãs em geral (1 Co 11.16), o que indica que o uso do véu não era prática restrita apenas à igreja de Corinto, mas de todas as igrejas cristãs espalhadas pelo mundo grego" (http://www.mackenzie.br/fileadmin/Mantenedora/CPAJ/revista/VOLUME_II__1997__1/ordenacao....pdf).

    "Princípio teológico supra cultural e a expressão cultural deste princípio", Renan A. Moreira onde foi que eles viram isso no texto?

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  11. RC. Sproul escrevendo sobre a cultura e a Bíblia afirma de maneira clara o que fazemos com um texto quando injetamos nele a cultura, o seguinte:

    "Algumas maneiras muito sutis de relativizar um texto ocorrem quando injetamos no mesmo considerações culturais que não deveriam estar lá. Por exemplo, com respeito à questão do véu sobre a cabeça das mulheres em Corinto, numerosos comentaristas da epístola salientam
    o fato de que o sinal de prostituição em corinto era a cabeça descoberta. Portanto, diz o
    argumento, a razão pela qual Paulo desejava que as mulheres cobrissem suas cabeças era evitar uma semelhança escandolosa das mulheres cristãs com o aspecto exterior de prostitutas.

    Qual o erro neste tipo de especulação? O problema básico neste caso é que nosso conhecimentoresconstituído da Corinto do primeiro século nos levou a descobrir em Paulo uma análise racional que é estranha àquela dada por ele mesmo. Em palavra, não estamos apenas colocando palavras na boca do apóstolo, como também ignorando as informações que estão lá. Se Paulo tivesse meramente ordenado às mulheres em Corinto que cobrissem a cabeça sem lhes dar nenhuma razão para isto, nós nos sentiríamos fortemente inclinados a suprir esta razão por meio de nosso conhecimento cultural. Neste caso, entretanto, Paulo fornece sua exposição de motivos baseada num apelo à criação, e não aos costumes das prostitutas de Crorinto.

    Devemos ser cuidadosos para não permitir que nosso zelo pelo conhecimento da cultura obscureça aquilo que está realmente escrito.
    Subordiniar as razações expressas de Paulo às nossas razões elaboradas especulativamente é
    caluniar o apóstolo e transformar exegese em eisegese" (SPROUL, 2003, p.119-120 - http://www.editoraculturacrista.com.br/produtos.asp?codigo=220).

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  12. Mas adiante na mesma obra o grande teólogo afirma:

    "Se algum principio bíblico transcende os limites de costumes locais estes são os apelos deduzidos da criação. Apelos às ordenanças da criação refletem cláusulas de uma aliança que Deus fez com o ser humano equanto ser humano. As leis da criação não são dadas aos homens como hebreus, ou como cristãos, ou como corítios, mas estão enraizados numa responsabilidade humana básica para com Deus. Pôr de lado princípios da criação como meros costumes locais é o pior tipo de relativização e negação da historicidade do conteúdo bíblico. E, é precisamente neste ponto que muitos especialistas têm relativizado os princípios escriturísticos. É também neste campo que vemos o método existencial (Martin Heidegger e Bultmann), operando mais ofensivamente" (Ênfase acrescentada, p. 120).

    Sem dúvida que essa maneira de ver o texto Sagrado tem ao longo dos anos solapado a sua autoridade.

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  13. Renan A. Moreira, estou levantando um grupo para tratarmos do assunto acima, então, gostaria de saber se você poderia enviar para o meu e-mail gunnarlima@hotmail.com o material em pdf.

    Obrigado desde já!

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  14. Renan um outro assunto muito relevante para os nossos dias, mas pouco visto de fato na sua natureza é João 13. Estaria Cristo ordenando nos versos 14 e 15 a instituição do lava pés? Qual o tratamento devemos dar a essa passagem que semelhante 1 Co 11 também "sofre" nas mãos dos santos doutores.

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  15. Gunnar Vingren,

    Essa pergunta te respondi em uma postagem anterior. Colo o trecho abaixo:

    "O ósculo santo e o lava-pés me parecem práticas essencialmente culturais. O ósculo tem uma relação de "submissão", companheirismo, este é o motivo pelo qual Paulo sempre falava de ósculo santo. Quanto ao lava-pés, não há como ver como uma ordenança pelo fato de que não há uma repetição da informação nas Escrituras e nem é posto o padrão de "não vos ensina a própria natureza"? além do mais, uma análise da prática nos mostrará que geralmente, na região oriental, as pessoas adentravam a casa de outrem com os pés com pó da estrada e que os SERVOS se punham a lavar os pés a fim de que os visitantes ficassem mais a vontade. O ensinamento de Cristo não está vinculado ao "lavar os pés", mas sim "agir como servo", se submeter a outrem, agir de forma necessária, ainda que pareça humilhante.
    Muito embora eu reconheça o lava-pés como uma prática cultural, vejo que pode haver alguma utilidade dela. O problema é que se a prática não vier acompanhada do conteúdo explicativo, perde todo o sentido e se torna uma forma apenas de sujar uma toalha."

    Aqui faço um adendo óbvio: posso estar errado. Caso discorde, me explique a fim de que possamos compartilhar e aprender juntos. Abraços, meu irmão.

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  16. Eu estou mais para aprender junto que discordar meu amigo. Essa história que há elementos culturais no texto é uma linha muito tênua. Se dissermos que tudo é princípio então temos que pregar descalço segundo Lc 10.4, mas se legarmos tudo a questão cultural textos como Jo 13 e 1Co 11.2-16, serão levados para outro extremo. Segundo, o argumento que o texto não se repete ou o ensino da própria natureza, é um tanto perigoso se servir dele, se formos ser sinceros. Vai abrir um leque para os oponentes verem que quando queremos algo logo dizemos é mandamento, e quando queremos é cultural, não há repetição da passagem. Todavia, temos o próprio Cristo nos dando uma ordem nos versos 14 e 15 Jo 13 contra todos os nossos pressupostos de interpretação. Sobre isso R.N.Champlin afirma o seguinte na Enciclopédia de Bíblia, Teologia & Filosofia (vol 6, pg. 740):

    Se alguém aceita o ponto de vista comum sobre a canonicidade e a inspiração das Escrituras, comumna igreja evangélica , mas, no entanto, não aceita que o lava-pés é uma ordenança perpétua e obrigatória para os cristãos , então, após examinar os versículos catorze e quinze do capítulo treze do evangelho de João, deverá apresentar uma interpretação válida negando que o autor sagrado pretendia que a prática do lava-pés fosse algo perpétuo e universalmente obrigatório para a igreja cristã. Queremos adiantar, contudo, que é muito difícil para alguém encontrar uma interpretação alternativa honesta".

    Bem, quero lembrar o que disse antes estou mais para comprtilhar o conhecimento que discordar aqui. Eis a minha pequena reflexão sobre o assunto e obrigado por responder meus questionamentos, muito embora saibamos de nossas divergências

    O livro do RC SPROUL O Conhecimento das Escrituras citado por mim em comentários anteriores, continua como referência.

    Um abraço!

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